Conheci Bob Bradshaw em 1998. Ou talvez tenha sido em 99… na época, viva na sala de um apartamento de dois quartos que dividia com dois amigos em Hollywood.
Já tinha ouvido falar dele ou visto seu nome muitas vezes, em revistas como a Guitar Player, ídolos da música na minha adolescência, professores, colegas de GIT e heróis da guitarra que tive a chance de assistir ao vivo.
Era um sonho meu ter um sistema feito por ele. Me lembro de frequentar lojas como a Black Market Music na La Cienega Boulevard e pouco a pouco, adquirir pedais e também de colocar parte do dinheiro que fazia tocando em bares, em um envelope, com o objetivo de eventualmente juntar a quantia necessária.
Não lembro como consegui seu número de telefone, mas sei que liguei e marcamos um horário para discutirmos o que eu queria. Entrar em seu atelier na Magnolia Boulevard era como entrar em um dos mais sagrados templos do som de guitarra no planeta. Nas paredes, fotos autografadas de lendas do instrumento que cresci escutando, racks e sistemas sendo montados e testados, componentes eletrônicos, aparalhos empilhados em mesas de trabalho; pilhas de equipamentos e pedais espalhados pelo chão, esperando tornarem-se o sistema de fulano ou ciclano. Esse era o lugar onde os melhores dos melhores iam buscando levar seu som para o próximo nível.
E lá estava eu, um menino de vinte-e-um ou vinte-dois anos, nervoso, tímido, constrangido, falando com o mestre sobre montar um rack de pedais para tocar em bares pela cidade. O mestre era, como na maioria dos casos, um verdadeiro gentleman e me tratou com o mesmo respeito e atenção com que trataria um rockstar, sua clientela de costume. Conversamos sobre minhas necessidades naquele momento e concordamos em um design. Segui trabalhando, tocando e economizando para comprar as peças que faltavam e dentro de alguns meses, o sistema foi concluído.
Durante esse tempo de espera, uma sensação de dúvida apareceu. Eu ia mesmo investir todo esse dinheiro em algo no que não tinha certeza (apesar de todas as evidênicas provando o contrário) de que iria soar bem? Sabia eu como esperava que o sistema soasse? Provavelmente não.
Recebi o telefonema para ir buscar o sistema e lá fui eu. Tinha me mudado para um dos quartos naquele momento e a sala ainda não havia sido ocupada. Na sala vazia e com a mente cheia de medo e dúvidas se eu havia feito um bom investimento, montei meu amplificador, rack e pedaleira e os liguei. Um acorde foi tudo o que precisei para acabar com esses sentimentos de uma só vez. O sorriso na minha cara era enorme e dizia tudo… “Confiamos no Bob”.
Um pouco tempo depois, passei a morar com minha parceira na época e por casualidade, nossa casa ficava a duas quadras da oficina do Bob e eu passei a visitá-lo de vez em quando. Comprei um de seus preamps e pedi para ele montar outro rack que complementasse o primeiro. Fazia muitas sessões de gravação nesta época e o sistema sempre soava lindo.
Perdi contato e não o vi por alguns anos até ler uma postagem dele no Facebook pedindo ajuda a seus amigos com sua mudança. Estava morando e trabalhando em uma antiga fábrica transformada em lofts no centro de Los Angeles. Chamei meu amigo Lineu Andrade e fomos ajudá-lo a carregar caixas por algumas horas e dizer-lhe adeus já que estava se mudando parra a costa leste do país.
Passaram-se alguns e outro amigo postou sobre seus novo sistema e isso me inspirou (e sendo honesto, me deixou com um pouco de ciúmes) a começar a explorar a possibilidade de montar o que chamava então de O Último Sistema de Guitarra que eu encomendaria.
Dois anos mais e agora buscava decidir o que levaria para a turnê com Lionel Richie. Depois de pensar bastante sobre o assunto, decido ligar para o Bob e conversar sobre talvez consolidar e reaproveitar os sistemas que tinha parados em um armazém. Descubro que Matt, que é quem cuida das guitarras e baixos na turnê mora na mesma cidade e já trabalhara com ele em sua oficina. Sei que Bob tem uma agenda lotada e se tornara um pouco mais seletivo com os trabalhos que aceitava fazer, portanto não era garantido que ele pudesse ou aceitasse trabalhar em um sistema novo para mim, mas começo a planejar, juntar as peças do quebra-cabeça, testar o que tenho na esperança de que possa reutilizar a maior parte e assim, economizar durante o processo. Eventualmente tudo se alinha, com uma sincronicidade as vezes surpreendente e temos o sinal verde para prosseguir.
Não via Bob desde que saiu de Los Angeles, em 2017. Viajei até Lancaster, no estado da Pensilvânia no final de março, aproveitando que teríamos um show na cidade de Filadélfia quatro dias depois, para buscar o novo sistema e deixá-lo com o resto do equipamento que voltaria de caminhão para a costa oeste.
O mesmo sentimento de dúvida voltou a surgir e me perguntei se teria tomado a decisão correta com relação a esse investimento mas novamente, tudo que precisei para acalmar estas questões foi um único acorde de guitarra e o mantra sendo repetido: “Confiamos no Bob!”
Obrigado meu amigo por ser impecável com seu trabalho e sua palavra. Por tratar aquele garoto de maneira tão gentil e cavalheiresca e por nos inspirar ao redor do mundo com seu gênio.
Um brinde ao Penúltimo Sistema de Guitarra que encomendarei!